quinta-feira, 7 de junho de 2007

Introdução Histórica


No Brasil, a exploração mineral do chamado ouro de lavagem, uma escassa atividade, teve início no final do século XVI na capitânia de São Vicente. Mas em razão da baixa rentabilidade, foi rapidamente abandonada. Somente no século XVIII é que a mineração realmente passou a dominar o cenário brasileiro, intensificando a vida urbana da colônia, além de ter promovido uma sociedade menos aristocrática em relação ao período anterior, representado pelo ruralismo açucareiro. A mineração, marcada pela extração de ouro e diamantes nas regiões de Goiás, Mato Grosso e principalmente Minas Gerais, atingiu o apogeu entre os anos de 1750 e 1770, justamente no período em que a Inglaterra se industrializava e se consolidava como uma potência hegemônica, exercendo uma influência econômica cada vez maior sobre Portugal.

Em contrapartida ao desenvolvimento econômico da Inglaterra, Portugal enfrentava enormes dificuldades econômicas e financeiras com a perda de seus domínios no Oriente e na África, após 60 anos de domínio espanhol durante a União Ibérica (1580-1640). Dos vários tratados que comprovam a crescente dependência portuguesa em relação à Inglaterra, destaca-se o Tratado de Methuem (Panos e Vinhos) em 1703, pelo qual Portugal é obrigado a adquirir os tecidos da Inglaterra e essa, os vinhos portugueses. Para Portugal, esse acordo liquidou com as manufaturas e agravou o acentuado déficit na balança comercial, onde o valor das importações (tecidos ingleses) irá superar o das exportações (vinhos). É importante notar que o Tratado de Methuem ocorreu alguns anos depois da descoberta das primeiras grandes jazidas de ouro em Minas Gerais, e que bem antes de sua assinatura as importações inglesas já arruinavam as manufaturas portuguesas. O tratado, deve ser considerado assim, bem mais um ponto de chegada do que de começo, em relação ao domínio econômico inglês sobre Portugal.

Nesse mesmo período, em que na América espanhola o esgotamento das minas iria provocar uma forte elevação no preço dos produtos, o Brasil assistia a passagem da economia açucareira para mineradora, que ao contrário da agricultura e de outras atividades, como a pecuária, foi submetida a uma rigorosa disciplina e fiscalização por parte da metrópole.

Já por ocasião do escasso e pobre ouro de lavagem achado desde o século XVI em São Vicente, tinha-se promulgado um longo regulamento estabelecendo-se a livre exploração, embora submetida a uma rígida fiscalização, onde a Coroa reservava-se no direito ao quinto, ou seja, a quinta parte de todo ouro extraído. Com as descobertas feitas em Minas Gerais na região de Vila Rica, a antiga lei é substituída pelo Regimento dos Superintendentes, Guardas-mores e Oficiais Deputados para as Minas de Ouro, datada de 1702. Esse regimento se manteria até o término do período colonial, apenas com pequenas modificações.

Para fiscalizar, dirigir e cobrar o quinto nas áreas de mineração criava-se a Intendência de Minas, sob a direção de um superintendente em cada capitania em que se descobrisse ouro, subordinado diretamente ao poder central. O descobrimento das jazidas era obrigatoriamente comunicado ao superintendente da capitania que requisitava os funcionários - guarda-mores - para que fosse feita a demarcação das datas e lotes que seriam posteriormente distribuídos entre os mineradores presentes.

O minerador que havia descoberto a jazida tinha o direito de escolher as duas primeiras datas, enquanto que o guarda-mor escolhia uma outra para a Fazenda Real, que depois a vendia em leilão. A distribuição dos lotes era proporcional ao número de escravos que o minerador possuísse. Aqueles que tivessem mais de 12 escravos recebiam uma "data inteira", que correspondia a cerca de 3 mil metros quadrados. Já os que tinham menos de doze escravos recebiam apenas uma pequena parte de uma data. Os demais lotes eram sorteados entre os interessados que deviam dar início à exploração no prazo de quarenta dias, sob pena de perder a posse da terra. A venda de uma data era somente autorizada, na hipótese devidamente comprovada da perda de todos os escravos. Neste caso o minerador só podia receber uma nova data quando obtivesse outros trabalhadores. A reincidência porém, resultaria na perda definitiva do direito de receber outro terreno. A cobrança do quinto sempre foi vista pelos mineradores como um abuso fiscal, o que resultava em freqüentes tentativas de sonegação, fazendo com que a metrópole criasse novas formas de cobrança.

A partir de 1690 são criadas as Casas de Fundição, estabelecimentos controlados pela Fazenda Real, que recebiam todo ouro extraído, transformando-o em barras timbradas e devidamente quintadas, para somente depois, devolve-las ao proprietário. A tentativa de utilizar o ouro sob outra forma – em pó, em pepitas ou em barras não marcadas – era rigorosamente punida, com penas que iam do confisco dos bens do infrator, até seu degredo perpétuo para as colônias portuguesas na África. Como o ouro era facilmente escondido graças ao seu alto valor em pequenos volumes, criou-se a finta, um pagamento anual fixo de 30 arrobas, cerca de 450 quilos de ouro que o quinto deveria necessariamente atingir, sob pena de ser decretada a derrama, isto é, o confisco dos bens do devedor para que a soma de 100 arrobas fosse completada. Posteriormente ainda foi criada a taxa de capitação , um imposto fixo, cobrado por cada escravo que o minerador possuísse.

Havia duas formas de extração aurífera: a lavra e a faiscação. As lavras eram empresas que, dispondo de ferramentas especializadas, executavam a extração aurífera em grandes jazidas, utilizando mão-de-obra de escravos africanos. O trabalho livre era insignificante e o índio não era empregado. A lavra foi o tipo de extração mais freqüente na fase áurea da mineração, quando ainda existia recurso e produção abundantes, o que tornou possível grandes empreendimentos e obras na região. A faiscação era a pequena extração representada pelo trabalho do próprio garimpeiro, um homem livre de poucos recursos que excepcionalmente poderia contar com alguns ajudantes. No mundo do garimpo o faiscador é considerado um nômade, reunindo-se às vezes em grande número, num local franqueado a todos. Poderiam ainda ser escravos que, se encontrassem uma quantidade muito significativa de ouro, ganhariam a alforria. Também conhecida como faisqueira, tal atividade se realizava principalmente em regiões ribeirinhas. De uma maneira ou de outra, a faiscação sempre existiu na mineração aurífera da colônia tornando-se mais intensa com a própria das minas, surgindo então o faiscador que aproveita as áreas empobrecidas e abandonadas. Este cenário torna-se mais comum pelos fins do século XVIII, quando a mineração entra num processo de franca decadência.

A extração mineral não se restringiu apenas ao ouro. O século XVIII também conheceu o diamante, no vale do rio Jequitinhonha, sendo que durante muito tempo, os mineradores que só viam a riqueza no ouro, ignoraram o valor desta pedra preciosa, utilizada inclusive como ficha para jogo. Somente após três décadas que o governador das Gerais, D. Lourenço de Almeida, enviou algumas pedras para serem analisadas em Portugal, que imediatamente aprovou a criação do primeiro Regimento para os Diamantes, que estabeleceu como forma de cobrar o quinto, o sistema de capitação sobre mineradores que viessem a trabalhar naquela região.

O principal centro de extração da valiosa pedra, foi o Arraial do Tijuco, hoje Diamantina em Minas Gerais, que em razão da importância, foi elevado à categoria de Distrito Diamantino, com fronteiras delimitadas e um intendente independente do governador da capitânia, subalterno apenas à coroa portuguesa. A partir de 1734, visando um maior controle sobre a região diamantina, foi estabelecido um sistema de exclusividade na exploração de diamantes para um único contratador. O primeiro deles em 1740, foi o milionário João Fernandes de Oliveira, que se apaixonou pela escrava Chica da Silva, tornando-a uma nobre senhora do Arraial do Tijuco. Devido ao intenso contrabando e sonegação, como também ao elevado valor do produto, a metrópole decretou a Extração Real em 1771, representando o monopólio estatal sobre o diamante, que vigorou até 1832.

O ciclo do ouro e do diamante foi responsável por profundas mudanças na vida colonial. Em cem anos a população cresceu de 300 mil para, aproximadamente, 3 milhões de pessoas, incluindo aí, um deslocamento de 800 mil portugueses para o Brasil. Paralelamente foi intensificado o comércio interno de escravos, chegando do Nordeste cerca de 600 mil negros. Tais deslocamentos representam a transferência do eixo social e econômico do litoral para o interior da colônia, o que acarretou na própria mudança da capital de Salvador para o Rio de Janeiro, cidade de mais fácil acesso à região mineradora. A vida urbana mais intensa viabilizou também, melhores oportunidades no mercado interno e uma sociedade mais flexível, principalmente se contrastada com o imobilismo da sociedade açucareira.

Embora mantivesse a base escravista, a sociedade mineradora diferenciava-se da açucareira, por seu comportamento urbano, menos aristocrático e intelectualmente mais evoluído. Era comum no século XVIII, ser grande minerador e latifundiário ao mesmo tempo. Portanto, a camada socialmente dominante era mais heterogênea, representada pelos grandes proprietários de escravos, grandes comerciantes e burocratas. A novidade foi o surgimento de um grupo intermediário formado por pequenos comerciantes, intelectuais, artesãos e artistas que viviam nas cidades.

O segmento abaixo era formado por homens livres pobres (brancos, mestiços e negros libertos), que eram faiscadores, aventureiros e biscateiros, enquanto que a base social permanecia formada por escravos que em meados do século XVIII, representavam 70% da população mineira. Para o cotidiano de trabalho dos escravos, a mineração foi um retrocesso, pois apesar de alguns terem conseguido a liberdade, a grande maioria passou a viver em condições bem piores do que no período anterior, escavando em verdadeiros buracos onde até a respiração era dificultada. Trabalhavam também na água ou atolados no barro no interior das minas. Essas condições desumanas resultam na organização de novos quilombos, como do rio das Mortes, em Minas Gerais, e o de Carlota, no Mato Grosso. Com o crescimento do número de pequenos e médios proprietários a mineração gerou uma menor concentração de renda, ocorrendo inicialmente um processo inflacionário, seguido pelo desenvolvimento de uma sólida agricultura de subsistência, que juntamente com a pecuária, consolidam-se como atividades subsidiárias e periféricas.

Na segunda metade do século XVIII, a mineração entra em decadência com a paralisação das descobertas. Por serem de aluvião o ouro e diamantes descobertos eram facilmente extraídos, o que levou a uma exploração constante, fazendo com que as jazidas se esgotassem rapidamente. Esse esgotamento deve-se fundamentalmente ao desconhecimento técnico dos mineradores, já que enquanto a extração foi feita apenas nos veios (leitos dos rios), nos tabuleiros (margens) e nas grupiaras (encostas mais profundas) a técnica, apesar de rudimentar, foi suficiente para o sucesso do empreendimento. Numa quarta etapa porém, quando a extração atinge as rochas matrizes, formadas por um minério extremamente duro (quartzo itabirito), as escavações não conseguem prosseguir, iniciando o declínio da economia mineradora. Como as outras atividades eram subsidiárias ao ouro e ao diamante, toda economia colonial entrou em declínio.

A suposta riqueza gerada pela mineração não permaneceu no Brasil e nem foi para Portugal. A dependência lusa em relação ao capitalismo inglês era antiga, e nesse sentido, grande parte das dívidas portuguesa, acabou sendo paga com ouro brasileiro, o que viabilizou ainda mais, uma grande acumulação de capital na Inglaterra, indispensável para o seu pioneirismo na Revolução Industrial.

Durante esse período de descobertas e extrações minerais no Brasil, vários interesses sobre o uso do solo e aproveitamento de suas riquezas surgiram e alguns conflitos envolvendo domínios territoriais marcaram parte da história nacional. O Amapá é um desses exemplos. Com o nome de capitania da Costa do Cabo Norte, a região, doada a Bento Manuel Parente em 1637, foi invadida por holandeses, ingleses e franceses que povoavam as Guianas, pouco depois expulsos pelos portugueses.

No século XVIII a França reivindicou a posse da área. Em 1713, o Tratado de Utrech tentou selar a paz, definindo o Oiapoque como fronteira entre os territórios da França e de Portugal, atualmente Guiana Francesa e Brasil, mas este não foi respeitado pelos franceses, o que desencadeou a construção da Fortaleza de São José de Macapá pelos portugueses, com o objetivo de proteger a região.

No século XIX, a descoberta do ouro e a valorização da borracha no mercado internacional aumentaram as disputas territoriais e o interesse pelas riquezas, com a França reivindicando a posse das jazidas de ouro. Em 1841, Brasil e França concordaram com a neutralização do Amapá, até encontrarem solução da pendência. Mas todas as conversações posteriores fracassaram. Somente em 1900, a Comissão de Arbitragem de Genebra deu ganho de causa ao Brasil, criando o território de Araguari, incorporado ao Pará e depois desmembrado por ocasião de sua transformação em Território Federal em 1943 com a atual denominação oficial.

Era tempo de guerra e nesse período a Inglaterra precisava de mineiro de ferro e os Estados Unidos de manganês. Na mesma época, por decisão do Governo Brasileiro, nasce a Companhia Vale do Rio Doce, com o objetivo de atender aos acordos firmados em Washington. Surge também um personagem que mudaria a história do Amapá. Falamos de Augusto Trajano de Azevedo Antunes. Sua história na Amazônia remonta à década de quarenta. Durante o ano 1938, quando trabalhava como engenheiro civil na cidade de São Paulo, ele deslocou-se até Minas Gerais para uma pesquisa em mineração, que acabou por levá-lo a dedicar-se definitivamente a esta atividade. Antes de vir para o Amapá em 1946, Antunes era presidente da ICOMI, empresa de Belo Horizonte que explorava minério de ferro, manganês e calcário, sendo na época uma das maiores fornecedores de minério para Volta Redonda.

No ano de 1945 a "Hanna Exploration Co." fez prospecções nas jazidas de minério da região do rio Vila Nova, no sul do Amapá, mas sem resultado animador. Na época o Governador do Território do Amapá era Janary Gentil Nunes, que estava decidido a promover o aproveitamento dos minérios do Território, tendo lançado uma camada de estímulo à prospecção, prometendo compensações a quem lhe trouxesse amostras de minério e soubesse indicar sua procedência.

Durante a campanha, o caboclo de nome Mário Cruz se lembrou que anos atrás usara umas pedras pretas e muito pesadas como lastro para sua embarcação, na qual fazia comércio pelos rios e igarapés da região. Mário se lembrava de tê-las abandonado ao fim da viagem, nas proximidades de Porto Grande. Foi buscá-las, julgando tratar-se de minério de ferro e apresentou-se ao Governador. As análises identificaram o minério: manganês, com teor de 55% aproximadamente.

Para evitar que empresas de mineração entrassem desordenadamente nas áreas, a jazida foi decretada reserva nacional, conforme publicado no Diário Oficial de 13 de dezembro de 1946. Antes de o governo abrir concorrência para exploração da jazida, Janary convidou Antunes para visitar a área, que era de difícil acesso. Antunes foi até o local em plena selva, viu o minério aflorado, estudou todos os relatórios dos geólogos e analisou ele próprio as amostras colhidas. Tratava-se de Serra do Navio. Quando o governo abriu concorrência, a ICOMI foi a única empresa genuinamente brasileira a apresentar-se como candidata, disputando com a "Hanna Exploration Company" e com a Companhia Meridional de Mineração, subsidiária da "United States Steel", e saiu vencedora da concorrência.

Entre o Governo do Amapá e a ICOMI foram assinados sucessivos contratos de concessão. Em dezembro de 1947, assinava-se o contrato para explorar o manganês do Amapá, sendo revisado, mais tarde, em 1950. Em janeiro de 1948 Azevedo Antunes foi para lá com 100 homens. Já corria o tempo de Guerra Fria e a União Soviética havia bloqueado o fornecimento de manganês para os Estados Unidos. A reserva do Amapá tornou-se estratégica e novamente o território amapaense estava em destaque, como na 2a Guerra Mundial, quando os Estados Unidos construíram base militar na cidade de Amapá para dar apoio aos seus aviões que iriam para a África. Porém surgiram novos entraves ao empreendimento: para se montar infra-estrutura de exploração que as minas exigiam e mereciam era preciso muito dinheiro, recursos estes que não podiam ser encontrados no Brasil. Sendo assim, em 1949, Azevedo Antunes foi a Washington e trouxe assinado contrato com o aval do governo brasileiro do então Presidente Getúlio Vargas. Associou-se a Bethlehem Steel , que aceitou a parceria de 49% contra 51% do sócio brasileiro, conseguindo um crédito de 67,5 milhões de dólares do Exibank de Washington, ficando a comercialização do minério no Brasil, com compra de 20% da produção pela Bethlehem Steel. O segundo contrato firmado com o Governo do Amapá, assinado em 1953, referia-se à concessão de área para construção de um embarcadouro de minério, no local denominado Porto Macapá, ou Porto Santana, no estuário do rio Amazonas. E o terceiro, também de 1953, referia-se à construção de uma estrada de ferro, destinada ao transporte de minério desde as jazidas até o embarcadouro. Cada contrato continha cláusulas rigorosas, impondo obrigações à concessionária e fixando prazos curtos para seu cumprimento.

As exigências contratuais foram todas atendidas pela ICOMI, sendo os prazos também cumpridos com antecipação. Essa presteza e exatidão no cumprimento as exigências com o Governo chegam a ser surpreendentes. Aquilo que deveria ser aceito como regra corriqueira, em nosso país ainda é encarado com obsessão. Assim, para iniciar o aproveitamento das jazidas de manganês e a venda do minério, a ICOMI comprometeu-se a projetar e construir, em prazos reduzidos: acampamentos provisórios nas frentes de trabalho; um porto fluvial para navios de grande calado, dotado de píer fixo e de píer flutuante; uma estrada de ferro com bitola de 1,435 m, na extensão de 194 km. incluindo pontes e pontilhões, sendo que 85 km do percurso seriam através da selva; Instalações industriais destinadas à extração, movimentação e beneficiamento do minério; duas vilas residenciais, destinadas aos empregados da Companhia e respectivas famílias.

No dia 5 de janeiro de 1957 o presidente Juscelino Kubitschek acionou o botão para o embarque da primeira carga de manganês para Baltimore, nos Estados Unidos.No decorrer dos anos a ICOMI promoveu uma evolução progressiva do então Território Federal do Amapá, pois quando a empresa chegou ao Amapá, a Capital Macapá tinha somente 3 mil habitantes e a economia do território baseava-se primordialmente no cultivo de subsistência, extrativismo madeireiro e pequeno comércio.

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